Maio: Uma carta para NUNCA ser enviada
Eu sei, eu sei. Comecei o projeto de 12 Cartas em 12 Meses em 2017 e até hoje não finalizei. Porém, como 2020 é um ano de desfechos e novas aberturas para mim, eis-me aqui para prosseguir com a carta de maio - a mais difícil na minha opinião. Vou direcioná-la a uma pessoa que conheci.
Um dia, eu te chamei de melhor amiga. Lembra como nos conhecemos? Tínhamos uma amiga em comum, mas nós duas nem nos falávamos direito. Te dava um oi, você também - apenas por educação. Não é que a gente não se gostasse, só não parecia ter assunto mesmo.
Então essa amiga em comum foi embora. Ela era nossa melhor amiga, então eu não tinha ninguém para passar o intervalo e nem você. Então a gente ficava ali, sentada uma do lado da outra, cada uma ouvindo música no seu próprio fone. Você falava algumas coisas, eu outras. Então nós descobrimos várias músicas que eu amava e você também. Dividíamos o fone de ouvido, ríamos de tanta coisa. A gente saía da escola e já ia para o facebook para continuar fofocando.
Quando aquela amiga em comum retornou, foi ótimo. Porém, não éramos mais um trio, era uma dupla: eu e você. E nós duas amávamos ela, porém acabamos criando uma bolha. Você se tornou minha melhor amiga, a pessoa com quem eu podia contar. E aí eu descobri coisas suas que me assustaram na época, você tinha alguns problemas e tentei ajudar. Eu também tinha minhas próprias questões, o início da adolescência é algo tão surreal.
Não tinha uma aula que a gente não sentava uma do lado da outra. Os professores até cansaram de reclamar, eles sabiam que assim que eu chegasse na sala, eu ia arrastar minha mesa para o lado da sua e a gente faria tudo juntas: as lições, dividir o fone para ouvir música, fofocar. E quando a gente não podia conversar, escrever o que queria dizer nas folhas do caderno.
Enquanto escrevo isso você não imagina o tamanho do meu sorriso. Eu te amei tanto, de uma forma pura e natural, inocente. Lembro de quando você chorou nos meus ombros porque seu namorado babaca te traiu. Ou de quando você me deu conselhos quando eu estava gostando de algum garoto. E percebemos algumas diferenças entre nós, e tentamos respeitar isso. Eu estava descobrindo a internet, amava escrever em blogues, comecei a me aventurar em RPGs e ler livros de fantasia e romance. Você debochava disso, mas nunca pra me machucar: você respeitava que eu era diferente em alguns aspectos e tudo bem.
E aí o ensino fundamental terminou, nos mudamos de escola e e não conseguimos ficar juntas: eu estudava de manhã e você à tarde. E eu nunca conseguia te ver, porque eu tinha horário para chegar em casa e você não podia sair mais cedo.
A comunicação foi ficando mais difícil, mas ainda assim prometemos continuar amigas. Eu morria de ciúmes das amigas novas que você ganhou, porque elas faziam mais o seu novo estilo: você pintou o cabelo, usava roupas desfiadas. Da mesma forma que eu mudei também ne? Mas eu respeitei quem você era.
Mas em algum momento, eu passei a me sentir inferior a você. Você era uma garota tão bonita, descolada e eu era o que? A esquisita sentada em um canto com um livro na mão. Eu passava cada vez mais tempo online e você já tinha autorização para sair com seus amigos para o shopping, eu nunca podia.
Eu me sentia presa dentro de casa, vendo todas as pessoas da minha idade fazendo algo como ir a um show, sair com a galera para ir ao cinema. O que eu fazia? Lia, cada vez mais. Eu podia passar o dia inteiro na minha cama além da escola, mas eu viajava para vários lugares.
Até que eu conheci um garoto que fez meu coração acelerar. Ele era lindo, e eu não conseguia deixar de gostar dele mesmo sem conhecê-lo melhor. Passei um ano inteiro tentando ter coragem de dizer algo mais do que um "oi, tudo bem?" e "tchaw, até mais". Até me aproximei de alguns amigos dele para ficar na mesma "rodinha", mas eu realmente não tinha muito em comum com eles.
Então, no final do ano, eu decidi que iria falar com ele porque no ano seguinte ele iria se formar. Mostrei fotos dele pra você que eu baixei do facebook dele, te contei o que estava sentindo e semanas depois você me diz que não posso falar com ele porque você se apaixonou por ele. Eu fiquei sem chão. Quem passou o ano todo sentindo algo era eu, e na primeira vez que te mando uma foto dele, você vai lá e adiciona o cara nas suas redes sociais? Você fez o que, teve coragem e foi conversar com ele?
Sim, eu fiquei mal e nem foi por ele, foi por você. Eu confiava em você e senti que isso foi um tapa. Então você disse: "ou você desiste dele e eu também desisto, ou nós duas vamos disputá-lo porque não vou desistir dele". Eu que já me sentia insegura pra caramba nem quis competir. Você era linda, interessante, e eu era o que? Nada. Foi o que senti na época. Preferia ficar com a sua amizade a competir por um garoto. Então nós prometemos que iríamos excluir ele das redes sociais, você se lembra disso? Da nossa promessa?
Antes disso, eu tive coragem de falar com ele pelo facebook só, disse que gostava dele e ele ficou meio que tipo: "Sério? Nunca percebi". Eu queria ter coragem de falar pessoalmente, mas aquilo foi um grande passo pra mim. Veja, eu nem queria algo sério, você sabe que não sou disso. Eu só queria ter coragem de revelar meus sentimentos. Ele falou sobre idiomas, sobre as irmãs dele, games. E então, depois do nosso acordo, eu simplesmente excluí ele.
A gente disse uma pra outra, não importa o que aconteceu, ainda somos amigas. as eu estava tão machucada que eu não conseguia mais falar com você, e fiquei mais presa ainda aos meus amigos virtuais, jogos online, livros e filmes. Você conheceu outra pessoa, namorou, seguiu em frente. Mas eu ainda gostava daquele menino, mesmo depois de anos e me sentia uma idiota. Por que eu tinha que gostar tanto dele? Não sei.
No final do ensino médio, eu já não te via a anos: mudei de bairro, de escola. A gente se falava cada vez menos. De vez em quando eu te mandava mensagem, tentava te ajudar. Mas a vida nos separou, cada um foi para um lado.
Lembro de te perguntar, "você lembra daquele garoto de anos atrás? Você se importaria se eu fosse falar com ele?". Acho que eu já estava na faculdade. Você disse que não, mas falou muito mal dele. Disse que ele era frio, que isso e aquilo. E eu fiquei sem entender. Você ficou com ele? Namorou com ele? Mas você não tinha prometido que não ia ter nada com ele e que ia excluir ele da mesma forma que eu fiz?
Mandei várias mensagens pra ele, mas se quer saber eu nem imaginava que ele fosse lembrar de mim. Eu só queria dizer tudo o que estava sentindo e ver se finalmente seguia em frente. O problema? Ele me reconheceu e sabia quem eu era. Eu disse que só exclui ele e me afastei porque fiz um acordo com você, e sabe o que ele disse?
-É óbvio que ela diria isso, ela estava protegendo o que era dela ne?
E eu fiquei tipo, que? Eles realmente namoraram? Não sei até hoje o que aconteceu, não quis nem perguntar porque não é problema meu. Ele disse que você foi alguém indiferente na vida dele, mas só se arrependia da forma como te tratou no final, que não queria te machucar.
Eu conheci um pouco do homem que ele se tornou. Gostei do humor dele, do jeito. Eu dizia a mim mesma que precisava parar de falar com ele, mas não conseguia. Até que enfim consegui e foi libertador depois de tantos anos.
E o que eu quero dizer com tudo isso é que eu sinto muito por tudo. Eu tenho a minha visão do que aconteceu, você tem a sua. Tentamos manter diálogo, mas a questão é que simplesmente não rolava assunto. Não que eu tenha algum ressentimento, hoje em dia me sinto mais madura, e respeito demais a pessoa que você foi pra mim. Quando tudo começou a desandar? Quando você se tornou uma pessoa tão indiferente na minha vida? Eu te contava tudo, e agora não te conto nada. Não nos falamos mais. Eu devo te mandar um oi? Devemos nos encontrar de novo? Ou simplesmente seguir em frente com nossas vidas, já que tudo mudou?
Eu queria te conhecer de novo. Eu sei que você curte filmes de terror, eu sou dos romances e da fantasia. Será que somos tão diferentes agora que não temos nada em comum?
Um dia, eu acho que ainda vou te mandar uma mensagem. Vou te dar um oi, perguntar como você está, dizer que sinto muito. Mas eu tenho medo do que você vai dizer, se você vai me culpar pelo distanciamento. Se você me culpa por gostar do garoto que você provavelmente deve ter namorado. Eu sinto tanto, eu não sabia.
Confesso que acabei de entrar no seu perfil do facebook, acho que não fiz isso em uns 4 anos. Acho que nunca vou te enviar essa carta. Não seria justo depois de todos esses anos eu aparecer ne? Só espero que você seja feliz, que esteja bem e te desejo tudo de bom. Obrigada por ter sido a pessoa que você foi na minha vida, pois apesar de não fazer mais parte ainda assim marcou história.
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