A sensação de estar prestes a partir
Era pra ser só uns 4 meses. Aí virou 6. Quase foi 8. E agora são 10 meses, com aquele adicional de 6 meses com visto de trabalho que confesso serem tentadores. Quase 1 ano e meio morando fora do Brasil. Tem um ano que me planejo para isso, e naquela época, eu estava decidida a mudar de país, mas pensei, "calma aí. Pera. Vamos fazer um teste antes. Vamos morar lá por alguns meses. Se der certo, nos mudamos. Se não, fica a experiência".
Foto: Pixabay
Em janeiro, comecei a onda de exames médicos. Alguns de rotina, outros por necessidade, principalmente porque precisava de médicos assinando que estou bem de saúde para viajar. Escolher qual programa de intercâmbio fazer, passa por uma entrevista, passar por outra. Faz um pagamento aqui, outro ali. Vai atrás de mais assinaturas, mais documentos. Mais idas ao médico. Mais entrevistas. Uma aprovação aqui, outra ali. Finalmente descubro o lugar em que ficarei, e recebo as fotos.
Só que alguma coisa aconteceu, e minha mente meio que desistiu no meio do caminho. Notícias de bombas, mísseis e teleguiados contribuíram pra isso. Acho que ainda estou juntando pedaços de uma experiência um tanto traumática. Ou várias delas. E de repente eu só... não sei. Congelei. De novo. Mas tive certa ajuda e alguns empurrões, e não tem mais volta, a passagem já está comprada. É oficial, eu vou. Já mandei email solicitando afastamento no trabalho, já conversei com meus irmãos, estou na fase de ir avisando os amigos aos poucos.
A mistura de ansiedade, empolgação e medo
Eu estava com medo. Medo de não falar o idioma local, do meu péssimo inglês, da guerra. De deixar meus irmãos, de dar uma 'pausa' na minha carreira, de não saber do futuro. Mas principalmente? Medo da mudança. Vou morar em outro local, em outro país, e não vou ser a mesma pessoa. Quero dizer, ainda vou ser eu, mas com certo upgrade. Meu maior medo é de talvez não querer voltar, e isso me assusta às vezes. Eu tenho certa estabilidade aqui no Brasil, sou concursada, tenho minha comunidade, meus amigos. Amo meu país, e tantas coisas da nossa linda cultura. Mas a verdade é que faz um ano, que estou na vibe despedida.
Sério, me lembro de exatamente um ano atrás, comentar exatamente isso. "Parece que tudo que faço é uma despedida". Foram diversas as situações horríveis, em que me senti presa, sufocada, onde eu só queria ir embora.
Foto de TMS Sam
Talvez não seja, mas não sei... agora que deixei o medo de lado, vem a ansiedade. Eu quero ir logo. Quero embarcar no avião, quero chegar lá. Conhecer meu novo quarto, meus novos colegas de casa, saber das minhas funções. Estou morrendo de curiosidade pra saber mais detalhes da rotina. De encontrar um grupo de dança pra fazer parte, de ter tempo pra me dedicar aos projetos pessoais e dar adeus a 4 horas diárias de transporte público.
Tô tão empolgada pra rever alguns amigos, e pra conhecer novas pessoas. Pra começar a me adaptar, aprender mais do idioma, e talvez... pensar no depois. Onde eu poderia morar, quando o programa chegar ao fim? Com o que eu poderia trabalhar depois? Tem um leque imenso de opções e oportunidades se abrindo, e tenho certeza que muitas outras vão aparecer.
A pressão de resolver mil pendências antes da viagem
Ainda falta assinar o contrato, realizar mais alguns pagamentos. Mais algumas questões de saúde a serem verificadas. Questões do trabalho, principalmente. Eu tô doida pra ir, mas sei que essas pendências precisam ser resolvidas. Com urgência, rápido, e me falta esse fôlego pra terminar.
O mês de agosto é tão longo, sem nenhum feriado. Parece que uma eternidade ainda vai se passar. Só que ao mesmo tempo, tem tanta coisa que precisa ser arrumada e ajustada, que talvez vá passar num estralo.
E sem falar das saídas que preciso ter com alguns amigos, que já estão me cobrando. As despedidas com os alunos. Ah cara, eu vou sentir falta de muita coisa hein, mas tô realmente afim de terminar logo essas pendências e focar na minha mala.
Como é "saber que a vida vai mudar", mas ainda estar aqui
A sensação de que tudo vai mudar, mas eu ainda tô aqui, é sufocante. Eu quero que o tempo passe rápido, e quero aproveitar cada momento com as pessoas que eu amo. Minha maior preocupação é minha família, que mesmo provando por A mais B que estão bem, ainda continuam na minha mente.
Eles ficam preocupados comigo, como se ir pra guerra fosse pior do que ficar, mas de verdade... eu me preocupo com quem vai continuar aqui, nesses transportes horríveis, baixo salário, alta violência.
Meu irmão está conformado. Ele até me perguntou se eu já sabia em quais manifestações iria me meter, já que ele sabe que amo um bom protesto. Cara, tô contando os dias até estar em uma. As pautas lá são diferentes, mas tem muita coisa importante acontecendo e... poxa, quero tanto abraçar aquelas pessoas.
Dúvidas internas: o que vou sentir falta? O que estou buscando?
Vou sentir falta de comer paçoca. De abraçar meus amigos. De rir com meu irmão. Das aulas de Fit Dance, do meu grupo de dança, minha amada Lehakat. Da vibe do Carnaval.
Dos meus alunos, de dar aulas. De reclamar do governador e do prefeito. Tá, isso vou continuar fazendo de lá, mas ainda assim... vou sentir falta do meu trabalho, demais. Eu amo estar com jovens, apesar da burocracia e do revirar de olho deles. Vou sentir falta de entrar numa loja ou supermercado e ver marcas conhecidas, de ouvir o idioma português o tempo todo. Prevejo dores de cabeça por ouvir idiomas novos 24/7.
Mas tô buscando propósito, novos objetivos de vida. Novas oportunidades, algumas que aqui são mais difíceis. Eu realmente estou me sentindo sufocada aqui.
Há quatro anos, quando estava no mestrado e idealizando o doutorado, eu tinha esse desejo de passar pelo menos um ano ali, como pesquisadora visitante, e tinha até procurado potenciais orientadores. Nunca mandei mensagem direta pra nenhum deles, mas talvez, quem sabe... ir visitar algumas instituições, tentar marcar uma conversa pessoalmente.
Preciso arrumar meu quarto, mas dessa vez, não é simplesmente encontrar um lugar para guardar minhas coisas. É jogar fora certos itens, doar outros, e pensar no que vai na mala.
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